Srila Bhaktivedanta Vana Gosvami Maharaja
03 de setembro de 2017, Índia
Hoje é um dia muito belo e auspicioso, pois celebramos o Mahadvadashi e também o aparecimento de Sri Vamanadeva.
Assim que Krishna apareceu, Ele falou sobre Vamanadeva para Devaki e Vasudeva. Na Satya-yuga, eles estavam em um outro nascimento e tinham nomes diferentes. Devaki e Vasudeva realizaram penitências por milhares de anos para ter Bhagavan Vishnu como seu filho.
Devido às suas austeridades, o Senhor Vishnu apareceu diante deles. Eles Lhe pediram: "Por favor, dê-nos um filho como Você". Vishnu respondeu: "Não é possível ter um filho como Eu, pois Eu sou único e não há ninguém igual a Mim. No entanto, porque vocês fizeram austeridades tão severas, estou muito feliz e satisfeito. Não posso lhes dar alguém como Eu, mas Eu mesmo serei seu filho nas três eras que se seguirão, e vou lembrá-los de que sou o mesmo Vishnu para quem vocês fizeram grandes austeridades". Depois de dizer isso, o Senhor Vishnu desapareceu.
Portanto, em Satya-yuga, o próprio Senhor apareceu como Prishnigarbha, o filho de Prishni e Sutapa. Depois, Ele apareceu como Vamanadeva, o filho de Kashyapa e Aditi. E por fim, Ele apareceu na forma de Krishna, o filho de Devaki e Vasudeva.
Ele apareceu do ventre de Devaki como o Senhor Narayana, com shankha e chakra, e lhes disse: “Por favor, tenham o Meu darshana. Conforme prometi, primeiro nasci como Prishnigarbha, depois como Vamana, e agora, nesta terceira vez, enquanto vocês são Devaki e Vasudeva, nasci como seu filho, e o mundo inteiro Me chamará de Vasudeva Krishna. Por favor, tenham o Meu darshana como Narayana.” Desse modo, o Senhor Vishnu apareceu diante deles enquanto estavam presos por Kamsa.
Agora, falarei brevemente sobre os passatempos do Senhor Vamanadeva. Desde tempos imemoriais, os demônios e os semideuses têm lutado entre si. No Srimad Bhagavad-gita (16.6), Bhagavan diz a Arjuna:
dvau bhūta-sargau loke 'smin
daiva āsura eva ca
daivo vistaraśaḥ prokta
āsuraṁ pārtha me śṛṇu
[Ó filho de Pritha, neste mundo há dois tipos de seres criados: um é chamado divino e o outro, demoníaco. Eu já expliquei bastante a você sobre as qualidades divinas; agora ouça de Mim sobre as demoníacas.]
Existem dois tipos de pessoas neste mundo, cada uma com a sua própria natureza. Uma tem uma natureza demoníaca e a outra, uma natureza “deva” – como os semideuses. Aqueles de boa índole são considerados sattvika, enquanto os de natureza rajasika ou tamasika são considerados demoníacos.
Conclui-se que aqueles que são devotos do Senhor Vishnu possuem a qualidade sattva-guna, e aqueles que se opõem ao Senhor têm qualidades tamasika ou rajasika-guna. Os devatas possuem uma natureza sattvika; eles realizam boas ações e práticas piedosas. E o que é a tendência asura-bhava? Aqueles que estão se entregando a kama (desejo) e krodha (raiva), causando dor e torturando ou roubando os outros – tudo isso é asura-bhava, e essas são qualidades tamasika.
A natureza de uma pessoa define como ela come, como se comporta e como geralmente age. Aqueles que são sattvika seguem um modo de vida restritivo. Por outro lado, pessoas de natureza tamasika e rajasika consomem carne, álcool, alho e cebola. Todos esses itens são tamásicos, e também nos tornam tamásicos se os consumirmos. É por isso que não devemos comer alho, cebola, carne ou álcool. Os demônios normalmente consomem álcool, e neste mundo, vemos muitos fazendo o mesmo. Todos esses atos são tamásicos e demoníacos, e servem apenas para aumentar a luxúria e a raiva. Quanto mais raiva e luxúria estiver presente, mais destruição haverá. Quando um homem está bêbado, por exemplo, ele chega em casa e briga com sua família, podendo até agredir sua própria esposa ou filhos.
É por isso que na Bhagavad-Gita, o Senhor diz: "Você deve ter qualidades sattva-guna". Se não tivermos bons hábitos, e se não mantivermos uma boa natureza, não poderemos adorar o Senhor adequadamente. Não poderemos realizar archana para Thakuraji se estivermos bêbados ou comendo carne. Se alguém está bêbado, como pode realizar archana para Thakuraji? A pessoa simplesmente cairá inconsciente devido à intoxicação. É por isso que nossos shastras nos instruem a manter um humor sattvika. Devemos tentar nos livrar de nossos humores tamasika e rajasika.
Shukracharya é o guru dos demônios, e Brihaspati é o guru dos semideuses. Observe como obtemos um guru de acordo com nossa própria natureza. Se alguém tem deva-bhava, obterá um guru genuíno, e se alguém tem uma natureza demoníaca, não obterá um guru genuíno.
De tempos em tempos, se tivermos menos nishtha no guru, demônios podem vir nos atacar. Também nunca devemos ofender nosso guru, de forma alguma. Eventualmente, quando Indra ou outros semideuses não estão seguindo seu guru corretamente, os demônios se tornam mais poderosos. Desse modo, os semideuses são atacados mais facilmente – o que geralmente resulta em sua derrota. Isso ocorre apenas quando eles não têm uma fé forte em guru. Isso vem acontecendo desde sempre, desde o início dos tempos – e continuará pela eternidade.
Tente entender que os asuras e os devatas têm o mesmo pai, Kashyapa, mas as suas mães são diferentes. Kashyapa teve duas esposas, Diti e Aditi. Os filhos de Diti se tornaram asuras, e os de Aditi se tornaram semideuses. Na verdade, é assim que a natureza de alguém é definida. No livro Bhajana-rahasya de Gurudeva, é explicado que a natureza da mãe é transferida para o filho, e a natureza do pai é transferida para a filha. É assim que a natureza opera e tem sido assim desde o início. É por isso que vemos todas as qualidades de Yashoda-maiya em Krishna. Também notamos que a natureza de Aditi está presente nos semideuses, e a natureza de Diti está presente nos demônios. Assim, desde o início dos tempos, eles têm lutado entre si.
Irei contar uma história dos Puranas. Certa vez, homens, demônios e semideuses se aproximaram de Brahmaji e reclamaram: "Ó pai, você criou nós três. Você deu aos semideuses os céus e os planetas celestiais. Você deu aos homens a terra e os planetas mundanos. Mas o que você deu aos demônios? Nada!” Na verdade, é por isso que ocasionalmente os demônios atacam os planetas mundanos e até mesmo os planetas celestiais. Eles perguntaram a Brahma: "Nós somos seus três filhos e somos como irmãos. Por quê você não deu nada aos demônios?” Brahmaji respondeu: “Isso não é culpa minha. Não sou eu quem dou algo. O que você recebe vem de acordo com seu karma, de acordo com sua natureza e com seu comportamento”. Depois de ouvir isso, os demônios disseram: “Oh, nós não entendemos isso. Como pode ser?”.
Assim, Brahma respondeu: "Vamos fazer o seguinte: amanhã eu convidarei vocês três para um banquete". No dia seguinte, ele primeiramente convidou os demônios. Foram distribuídos pratos a eles, e lhes foi oferecido um lugar para sentar. No entanto, Brahmaji impôs uma condição: "Todos vocês podem tomar prashada, mas eu tenho uma regra quanto à maneira de fazê-lo: quando vocês pegarem a prashada com a mão, não devem dobrar o pulso ou o cotovelo; o braço deve permanecer reto". Necessariamente, se você for comer algo, não pode manter o seu pulso reto. Você precisa movê-lo, bem como o cotovelo, para permitir que a comida entre em sua boca.
Os demônios responderam: “Como isso é possível? Como podemos comer sem dobrar nossos braços e sem qualquer movimento?”. Portanto, os demônios não se importaram e simplesmente começaram a comer, sem se preocupar se os outros já haviam comido ou não. A natureza dos demônios é semelhante à dos animais. Um animal não tem essas preocupações – quando sente fome, simplesmente come.
Posteriormente, quando os semideuses foram chamados para seu banquete, eles se encontraram na mesma situação: "Há uma condição, vocês não podem dobrar a mão, o pulso e o cotovelo – não podem movê-los, eles devem ficar retos". Os semideuses pensaram: "Como faremos isso?". Então, eles encontraram maneiras de lançar a comida diretamente de seus pratos para as suas bocas.
Finalmente, foi dada a mesma condição aos humanos. Os homens são inteligentes, então disseram: "Está bem, vamos nos sentar aqui e não vamos dobrar os braços. Vamos apenas garantir que estamos sentados em fila, com outra fila diretamente à nossa frente, para que possamos alimentar um ao outro". É por isso que os homens são inteligentes. Eles acreditam: "Eu terei e você também terá". Os humanos são astutos. Às vezes, até mesmo os semideuses oram para Brahma: "Dê-nos um nascimento como humanos, porque os humanos são inteligentes".
Atualmente, vemos que os asuras possuem os humanos. Podemos observar como os homens estão mudando. Não é da natureza do homem roubar; pelo contrário, a natureza de um homem é ter e também oferecer. Se uma pessoa está comendo dois rotis, é seu dever oferecer o outro para outra pessoa. No entanto, não é assim que os asuras são. Dessa forma, demônios e semideuses têm lutado desde o início dos tempos, pois são filhos do mesmo pai, mas com mães diferentes.
Bali Maharaja é o filho de Diti. A história de Bali Maharaja é muito bonita. Embora ele tenha nascido em uma família de asuras, ele tinha uma boa natureza. Algumas pessoas neste mundo são más e algumas são boas – há exceções em todos os lugares. Até mesmo alguns semideuses não são muito puros e podem não ser muito bondosos.
Há histórias no Bhagavatam que ilustram isso, como as de Indra e Chandra. Portanto, não significa que todos os devatas sejam muito bons; há alguns devatas maus também. Da mesma forma, há humanos bons e maus. Isso também se aplica aos asuras – há asuras maus e asuras bons.
Prahlada Maharaja, por exemplo, apesar de ser de uma família de asuras, era um grande devoto! Não importa onde você nasceu. Uma pessoa obtém sua identidade pela sua natureza e seu comportamento. O que importa é a sua natureza superior, não seu local de nascimento.
É por essa razão que estou dizendo isto – Bali Maharaja nasceu em uma família de asuras, assim como Prahlada Maharaja. Quem é o filho de Prahlada? Virochana, e o filho de Virochana é Bali. Há um ditado comum que diz: "Tal pai, tal filho". No entanto, isso nem sempre se aplica. Por exemplo, Hiranyakashipu não era um devoto, mas seu filho Prahladaji era. O filho de Prahlada era Virochana, e o filho de Virochana era Bali Maharaja. Assim, Bali Maharaja herdou a natureza de seu pai e avô. Agora, vamos falar brevemente sobre Bali Maharaja.
Ele era uma grande personalidade, o rei de todos os planetas celestiais, mundanos e inferiores. Ele tinha uma natureza sattvika, e realizava sacrifícios de fogo todos os dias. Quem quer que comparecesse ao sacrifício de fogo, receberia uma doação dele.
Certo dia, o Senhor Vamanadeva pensou: "Agora é uma boa oportunidade de tomar todos os reinos de Bali Maharaja". Vamanadeva se disfarçou como uma criança muito pequena. Vamana significa "anão". Há uma bela descrição de como o Senhor Vamanadeva andava com um guarda-chuva. Ele era tão baixinho que, enquanto andava, era difícil ver se havia alguém sob o guarda-chuva – parecia que o guarda-chuva estava simplesmente andando sozinho.
Então, Vamanadeva foi até Bali Maharaja e pediu: “Por favor, me dê alguma doação. Eu sou filho de um brahmana e Eu mesmo sou um brahmana. Não preciso de nada. Apenas me deixe medir três passos de terra”. Bali Maharaja começou a rir e disse: “Seu cérebro é tão pequeno quanto Você. Quem vem a um rei e pede uma abóbora?”. O vegetal mais barato é a abóbora. Talvez em países ocidentais elas sejam caras, mas na Índia, elas custam apenas cerca de vinte rúpias.
Bali Maharaja continuou: “Peça uma aldeia. Você é um brahmana. Eu lhe darei uma aldeia. Peça uma cidade”. E como o Senhor Vamanadeva respondeu? Ele estava apenas pedindo três passos de terra. Seus pés são tão pequenos, uma ou duas polegadas no máximo, razão pela qual Bali Maharaja começou a rir. Em resposta, Vamanadeva disse: “Tudo bem, eu medirei a terra usando Meus pés”.
Como alguém deve oferecer uma doação? Primeiro, ele tem que se purificar, realizar achamana e prometer três vezes: “Eu darei, eu darei, eu darei”. Então, quando Bali Maharaja ia fazer achamana, Shukracharya percebeu que o menino não era uma criança comum. Em vez disso, Ele era o Senhor Vishnu, disfarçado de anão, e agora iria tirar tudo do rei. Desse modo, Shukracharya disse a Bali: “Esta pequena criança é o próprio Vishnu, não dê nada a Ele”.
Bali Maharaja respondeu: “Gurudeva, hoje é um dia muito auspicioso para mim. O dono de tudo veio aqui para me pedir algo, e eu tenho muita sorte que Ele tenha vindo até mim! O que há de errado quando o próprio Senhor pede algo?”. Bali Maharaja tentou explicar ao seu guru Shukracharya: “Gurudeva, Bhagavan é o dono de tudo. Ele é quem criou todas as brahmandas, os inumeráveis universos. É um grande prazer para mim dar-Lhe qualquer coisa”. Shukracharya respondeu de maneira tola: “Se você der tudo a Ele, quem me dará dakshina?”. “Gurudeva, sinto muito. Vou dar a Bhagavan tudo o que Ele me pedir”, respondeu Bali Maharaja. Shukracharya pensou: “Bali não entende. Farei o que puder para impedir isso”. Enquanto isso, Vamanadeva apressava Bali: “Vamos, rápido!”.
Então, Bali Maharaja ia usar um pote cheio de água sagrada para fazer achamana. Mas o que Shukracharya fez? Ele assumiu a forma de um peixe e entrou no pote para impedir que a água saísse. Vamanadeva imediatamente entendeu o que estava acontecendo e disse: "Está bem, se a água está presa dentro do pote, podemos apenas desobstruí-lo com uma folha de grama". Depois que eles empurraram a folha de grama no pote, o olho de Shukracharya começou a sangrar e ele perdeu esse olho. Finalmente, Bali Maharaja conseguiu realizar seu achamana .
Há um ditado que diz que um guru não é um verdadeiro guru se não pode proporcionar benefícios reais ao seu discípulo. Da mesma forma, pais não são verdadeiros pais se não conseguem transformar seus filhos em devotos. Amigos não são verdadeiros amigos se não conseguem transmitir devoção uns aos outros. Uma esposa não é uma verdadeira esposa se não pode inspirar seu marido em direção a bhagavad-bhakti. E esse marido não é um verdadeiro marido se não pode encorajar sua esposa a realizar bhagavata-seva. Se isso ocorrer, você deve abandoná-los. Esta é uma instrução bastante amarga dada pelos nossos shastras. O que estou dizendo é que Shukracharya não era um guru genuíno, e deve-se sempre abandonar esse tipo de guru.
Bolo Vrindavana Bihari Lala ki jaya!
Jaya Jaya Sri Radhe!
Tradução: Vrindavana Palika Devi Dasi
Edição: Acyuta Priya Devi Dasi
Revisão: Taruni Gopi Dasi